“Entre o antigo e o novo” : o artesanato em couro do cariri sob a perspectiva do circuito da cultura

Abstract

Nas últimas décadas, o artesanato brasileiro tem ganhado crescente reconhecimento e valorização, integrando a agenda de políticas públicas voltadas à qualificação da mão de obra, ao aprimoramento de processos e produtos e ao incremento da renda gerada por essa atividade. Tais ações, somadas à inserção do artesanato em circuitos de consumo de maior prestígio e à atuação de designers em parceria com artesãos — visando melhorias técnicas, estéticas e comunicacionais —, vêm contribuindo para uma ressignificação do artesanato perante o olhar do consumidor contemporâneo. Nesse cenário, o artesanato em couro do Cariri cearense tem alcançado níveis inéditos de visibilidade midiática e valorização comercial. Tradicionalmente associado ao uso funcional por vaqueiros e à cultura local — como no caso de gibões e selas produzidos na região desde o século XVIII —, esses artefatos de couro hoje também ocupam espaços em galerias de arte, lojas especializadas e desfiles de moda, sendo incorporados por marcas brasileiras como elementos de identidade e estilo. Essa mudança no contexto de circulação provoca transformações nos significados atribuídos a tais objetos, uma vez que passam a ser consumidos por públicos que demandam produtos com atributos simbólicos e estéticos distintos de suas funções originais. A presente pesquisa tem como objetivo compreender as transformações pelas quais passou o artesanato em couro do Cariri ao longo do tempo. Para isso, optou-se pela metodologia de estudo de casos múltiplos, envolvendo três oficinas da região — Zé Moreno, André Cardoso e Chico Arte Nossa —, a fim de traçar comparativos que permitam identificar distintas formas e momentos de mudança. A investigação é fundamentada nos Estudos Culturais, especialmente no modelo teórico do Circuito da Cultura, que propõe a análise de fenômenos culturais por meio de cinco momentos interligados: produção, consumo, identidade, representação e regulação. Os resultados evidenciam que cada oficina promoveu alterações em diferentes etapas do circuito, o que revela a capacidade adaptativa do artesanato a contextos culturais diversos, refletindo dinâmicas sociais, econômicas e identitárias que influenciam em sua percepção e valor no mercado contemporâneo.