Dinâmica hidrossedimentológica frente à cenários futuros de uso do solo e mudanças climáticas na Zona da Mata de Pernambuco

Abstract

A maneira que os recursos ambientais são utilizados refletem a potencialidade de cada região, assim como o modelo econômico de desenvolvimento adotado pela sociedade. As mudanças no uso do solo, sejam em função de fatores naturais ou econômicos, impactam em grande medida a qualidade e disponibilidade dos recursos hídricos. De modo que essa dinâmica pode sofrer impactos cada vez maiores em função do crescimento das demandas da sociedade, associadas às intempéries climáticas que se apresentam cada vez de forma mais claras em vista do desenvolvimento de metodologias de análise climáticas. Em Pernambuco, dentre as regiões mais importantes socioeconomicamente, está a Zona da Mata. Esta região apresenta uma característica marcante quanto ao seu uso do solo, que é o histórico centenário de cultivo de cana-de-açúcar. No entanto, essa região observa alterações no uso do solo em função do crescimento industrial, das dificuldades que o setor sucroalcooleiro enfrenta para se manter competitivo em relação à outras regiões do país, fazendo com que áreas que antes eram dominadas pelo cultivo da cana-de-açúcar, sejam convertidas principalmente em pastagens e outros cultivos agrícolas. Para avaliar os reflexos dessa dinâmica nos recursos hídricos da região, foi utilizada modelagem hidrológica através do modelo SWAT (Soil and Water Assessment Tool) em duas das principais bacias hidrográficas do estado, as bacias dos rios Goiana e Sirinhaém. Após calibração e validação do modelo hidrológico, foram traçados cenários para simular condições de mudanças climáticas e de uso do solo, de modo a observar como as possíveis novas condições podem afetar a dinâmica hidrossedimentológica destas bacias. Os cenários de mudanças no uso do solo foram determinados buscando retratar a tendência atual de variação do uso, e pequenas alterações percentuais quanto à predominância de cada classe, com o intuito de prever mudanças não tão drásticas, de modo que os resultados representam ao máximo, possibilidades reais dessa dinâmica, uma vez que o processo de substituição de atividades econômicas é um processo geralmente lento e não linear no tempo. Foram simulados cenários de mudanças climáticas para estimar futuras condições baseadas nas tendências que a literatura atual aponta como possibilidades. Foram testadas variações positivas e negativas de 5% para a precipitação, e variações positivas na temperatura de 1°C e 3°C, para observar como essas mudanças impactariam na dinâmica hídrica das bacias hidrográficas analisadas. Os cenários propostos buscaram simular condições de uso do solo primeiramente, seguindo a tendência de diminuição de áreas destinadas à cultura da cana-de-açúcar, e convertendo-as em áreas de pastagem e mosaico de agricultura de sequeiro e pastagem. O outro cenário estimado manteve a lógica de redução da área de cana-de-açúcar, porém as classes que observaram aumento foram as de mosaico de agricultura de sequeiro e fragmentos de florestas. Os resultados obtidos para a bacia do rio Goiana apontam para redução dos volumes de água lançados à atmosfera em forma de vapor por meio da evapotranspiração, de modo que mais água permanece na superfície disponível para recarga de aquífero em função do aumento da percolação, no entanto, esse excedente hídrico também gera aumento do escoamento superficial e consequentemente, da produção de sedimentos, o que pode propiciar uma maior ocorrência de eventos de inundação e assoreamento dos corpos hídricos, além de perda de solo agricultável, quando associados aos eventos extremos de precipitação que cada vez mais se mostram recorrentes. Para a bacia do rio Sirinhaém as mudanças propostas do uso do solo pouco alteraram a dinâmica da evapotranspiração, a percolação variou levemente de forma negativa, assim como o escoamento superficial. A variação da produção de sedimentos se eu de forma irregular ao longa da bacia, no entanto, nas sub-bacias localizadas nos baixos cursos dos rios presentes na bacia, observou-se uma tendência de aumento dos volumes de sedimentos produzidos. Essa baixa alteração dos valores encontrados nos elementos do ciclo hidrológicos para a bacia do rio Sirinhaém pode ter sido em função de que, mesmo com a alteração do uso do solo, a cana-de-açúcar ainda se manteve como uso principal, praticamente resultando no somatório das áreas destinadas à pastagem, agricultura de sequeiro e fragmentos florestais. Quanto aos cenários propostos com o intuito de simular diferentes condições climáticas, foi-se constatado que ambas as bacias apresentam suscetibilidades relevantes quando à disponibilidade hídrica em cenários que projetam reduções nos volumes de precipitação e tendências à consideráveis aumento percentuais de escoamento superficial e produção de sedimentos em cenários que consideram um aumento no volume de precipitações na ordem de 5%. Esses resultados apontam para a necessidade de um planejamento efetivo com relação aos recursos hídricos no estado, uma vez que as crescentes demandas por água em função da expansão da demanda hídrica com o crescimento urbano e populacional, além do maior desenvolvimento do setor industrial na região, geram pressões sobre os recursos naturais. Some-se a isso o fato de que há muitas incertezas relativas às alterações que as mudanças climáticas podem impor ao estado, gerando uma necessidade de se tomar medidas de manejo para que se garantam a sustentabilidade das atividades econômicas, associadas ao atendimento das demandas hídricas da sociedade como um todo.